segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Ignoro.

imagem por: Decomarte

Caídas na minha mão. Sem cheiro, com as três pétalas superiores e de maior dimensão, e duas inferiores na esquina da sua beleza, juntas com o seu relevo amarelo alaranjado no seu ápice e outrora carnudas, caíram. Caíram na figura desvanecida, doente e envelhecida; com as suas veias em relevo, e sem o brilho que um dia tiveram, cada vez que nelas o sol era reflectido.


A orquídea branca desflorou. As outrora belas flores brancas estão agora enrugadas na minha mão. Aperto-as e pergunto-lhes o porquê, sem obter resposta. Ignoro. Ignoro, no centro da minha maior sabedoria, o porquê destes porquês. Por dizerem que o ignorante tem na posse a vida mais sábia de todas, sinto-me no centro da minha maior sabedoria e, ainda assim, ignorante. As flores, sem que nada lhes tenha dado razão para partir, apenas porque lhes apeteceu, foram embora.


Sentada e com as flores mortas na minha mão, ignoro. Ignoro o porquê de seres tão irracionais serem donos de uma racionalidade tão grande. A decisão sábia de partirem apenas porque sim, ou porque não, ou apenas porque ponto final. Apenas porque sentem que devem. Apenas porque o ar à sua volta se tornou irrespirável. Quantas vezes o ar se tornou irrespirável à minha volta e eu não parti? Ignoro.


Na noite fria que cai, deixo as flores deslizarem nos dedos enrijecidos pelos meus frios músculos. Elas assumem-se em queda livre, parando, imóveis, no chão. E eu ignoro o porquê, sem querer que alma nenhuma mo diga.

Porque há quem diga que o mais feliz é o que ignora o mundo em seu redor, ignoro e sou feliz. Por isso fecho os olhos, viro costas e aceito as coisas como elas são, tal e qual como uma criança que aceita um não. Ignoro. Recolho-me no meu canto e olho para o mundo de uma forma ignorante, sábia e feliz.

E tudo se torna mais simples.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

não me mintas.



Não me mintas. Não me contes histórias de fadas, não me tapes com pozinhos mágicos.

Não me mintas. Não queiras que caia nas tuas teias, não me apanhas com essa facilidade.

Não me mintas. Não me enganes dizendo que seguindo o vento irei ser feliz.

Não me mintas. Não me faças sentir mal por permanecer resguardada da tua corrente.

Não me mintas.

Não me mintas sobre tensos fios que na realidade estão cortados.

Não me mintas sobre lágrimas que derramaste. E, sinceramente, ainda espero receber enciclopédias de desculpas no meu correio, vindas de ti.

Eu não te minto. A fogueira das minhas acusações extinguiu-se, e não me faças sofrer por isso.

Eu não te minto, já não sou criança e já não caio nos teus contos.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

liberdade.

O telefone toca outra vez. Toca sem parar.

Um corpo levanta-se, de rompão, e quando o telefone pára de tocar já está ela a atingir a maçaneta da porta das traseiras.

A partir deste momento, há a quietude de uma cena dramática: consegue imaginar o telefone a continuar a tocar na sala deserta, a respiração do silêncio entre cada toque, a jarra de flores que se encontra ao lado dele, com as pétalas sopradas com força e espalhadas sobre a mesa, a cadeira vazia e empurrada para trás, a relva e as árvores mais ao longe, para lá da janela aberta com cortinados tocados pelo vento.

Ela corre, com toda a força, para o sítio mais longe que possa imaginar. Ela correrá até que a exaustão dos seus pulmões a impeçam.

Rompe a atmosfera que paira sobre as altas árvores como uma flecha. E continua a correr. A correr sem parar. Como uma criança que foge, brincando às escondidas.

Ela corre. Até ir parar num lugar onde nem ela própria se possa encontrar. Até se perder. De si, e do mundo.

Cai de joelhos na exaustão, presa ao seu corpo com finitas capacidades. O piso é húmido, e verde, e o sítio é completamente incógnito, sem identidade. Ela olha em volta, e vê a paz. Sem um telefone constantemente a tocar-lhe ao ouvido. Sem um tecto a esborracha-la contra o chão. Mudou de rua, e neste momento já não está no beco sem saída. “Sou livre”, fechou os olhos com força e pensou na sua nova condição, ainda que não esteja bem certa do que significa. Mas tudo o que ela estava era completamente sozinha, em lugar nenhum, desterrada numa terra desconhecida, como um explorador solitário sem bússola nem mapa. “Será isto a liberdade?”

domingo, 4 de outubro de 2009

sapatos negros.


Tenho uns sapatos negros calçados, os quais não consigo deixar. Pela vida usados, abusa, o parasita, de quem agarra.


Tenho Os sapatos negros envernizados, tatuagens que não consigo descalçar. Vira mundos do avesso, troca as coordenadas do Cabo das Tormentas para as do sítio onde habita, o parasita.


Tenho sapatos negros re e renegados, pelo medo de quem já se afundou. Muda correntes e confunde os ventos, traz a dor do sofrimento a quem jamais assim o provou.


Tenho o fim do poço em mim disfarçado, e já não tenho volta a dar. Os sapatos negros calçados, e a luz do mundo com a frágil vida a brincar.



Há quem tenho a pedra no sapato. Há quem tenha duas no seu estado maior.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

o vento trouxe-te


Ouvi falar de ti. Poderia ter sido algo mau, mas não foi. Lembrei-me dos cheiros, das cores. Das ruas e dos passos. Lembrei-me de ti e sorri. Sorri por ti. Sei que estás bem, que estás feliz. E sorri por mim, que voei falésias à saída do labirinto.

Ouvi dizer que o teu sol brilha, que as tuas amarras te prendem. Que dás passos confiantes no teu cominho… E sorri.


O vento trouxe-te, na brisa que habita a minha sombra. E eu sorri, por saber que lá continuas, e por saber que o vento me leva a ti, na curva do mundo, no instante em que este, afinal, pára.

terça-feira, 7 de julho de 2009

exaustão.

Encostou-se a sombra, em desespero, à parede.
Não é que se sentisse, mas, durante o movimento de transportar o peso do corpo de um pé para o outro, baixou a cabeça, deixando que a respiração ofegante dominasse o vaivém dos inconscientes movimentos.
O escuro parou ali. E pairou em todo o lado.

Porque é que insistem em puxar âncoras intemporais abruptamente?
A isto não se chama acto dogmático, mas sim o princípio da exaustão.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

é para amanhã...

Hoje vou escrever. Vou escrever até que a alma me doa.

Vou deixar que a minha mão dance com a caneta, enchendo folhas de rastos.

Deixar a minha mão nesse flutuar não é fácil. É o puxar a âncora do comodismo. É o irritar-me, ou apenas o suavizar-me com o ambiente envolvente.

“Deixar”… deixar contrasta tal esforço.

O vento dança nos meus cabelos, chamando-me. E o sol põe-se por entre altas árvores, onde luz rompe por falhas atingindo os meus olhos. Os pássaros cantam lá no alto, senhores do mundo. Melhor: senhores de si mesmos.

Não existe muita gente que partilhe desta perspectiva.

São poucas as pessoas que olham à sua volta.

“Deixar” não é assim tão fácil.

O sol já se pôs.

Hoje, poderia ter escrito. Poderia ter escrito até que a alma me doesse…

sexta-feira, 29 de maio de 2009

"impasse"


imagem: "sombra"- autor desonhecido

A escuridão invadiu os meus olhos quando te apressaste em entender tudo o que tinhas feito de forma errada, ao longo do teu percurso. A tristeza não se inibiu em apressar-se, alargando o seu passo rumo ao meu peito. Querias voar, não era? Era isso que tinhas camuflado nas tuas entrelinhas, quando meu sistema de negação se encarregou de não as captar.

Lembrara-me do dia em que me retiraste da onda de pó que cobrira a sala onde fiquei, e consequentemente me cobrira a mim, no acto desesperado de tapar o sofrimento que em meus olhos escorria, chegando a formar rios. Formara-se uma espécie de lama, lama em cada canto (meu, e da dita sala) … e em cada um desses cantos um negro consolidado prendera cada movimento que fosse possível de efectuar…
Foi nessa prisão que, conscientemente, eu deixei de me esforçar, de lutar, de me tentar libertar.

Quando entraste nessa sala, e, sem medos nem quaisquer hesitações, me arrancaste da escura estátua em que se tinha transformado o meu ser - porque talvez tenhas sentido algo mais que pó no canto onde eu me camuflara – a minha vida tomara outro rumo. Um rumo à felicidade.

Pois agora, querias voar, querias partir.
Sinceramente, quem dera que lá me tivesses deixado ficar…

domingo, 24 de maio de 2009

chave

James Hutton disse que "O presente é a chave do passado".
Será o passado a fechadura do presente?


Então mas... Estes termos (de certo modo, caídos numa utopia) não se tornam um pouco contraditórios aos que normalmente ouvimos...?

sexta-feira, 15 de maio de 2009

grita-me!


imagem: "bolhas para exibir o sol"

Grita-me!
Grita-me,
Como nunca o fizeste.
Grita-me, que eu
Gritar-te-ei com as restantes forças

Grita-me, vida!
Grita-me!
Grita-me na entoação
Do teu “porquê”,
Dos teus “porquês”.

Grita-me, vida!
Grita-me do centro da Terra,
Grita-me do ponto mais alto,
Grita-me um sentido,
Grita-me uma direcção!

Acorda-me no embalar
Da tua tristeza, da crueldade,
Mas grita-me, impera-te
Ensina-me como e
Com o quê gozar de ti.

Grita-me…
Grita e faz-me sentir,
Acorda-me desta anestesia
Que és tu, vida.
Quem, queria eu perguntar.

Grita e volta a gritar-me,
Faz-me ascender do fundo do mar,
Num tilintar de bolhas
Calmo, tal como alforrecas,
Do mar onde me deixaste adormecer.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

nevoeiro


A porta abre suavemente, com um ligeiro sopro.
Eu não te vou dizer que tenho medo,
Implorar que não vás,
Ou dizer-te que não vivo sem ti.
Talvez não viva.
Mas isso fazem os fracos.

A porta recua, esboçando a tua certeza.
A sala branca fica nublada sempre que deixas entrar essas incertezas.
A cor dela não muda,
Muda sim a nitidez da imagem através dessa mesma cor.
É baça. É fria, é húmida.
E eu não me sinto confortável.

A luz que atravessa o vidro da janela não é suficiente para iluminar a suspensão.
Talvez um dia entendas…

A porta fecha. A porta abre.
A maré vem, a maré vai.
Chega lua cheia, chega lua nova.
A porta fecha.
A porta abre.
Onde estás tu agora?

Outrora, sei que esta sala teve outras paisagens.
Em areais caminhámos, aqui mesmo. Ambos seguindo o som do mar reflectido nos seus búzios imortais.
Em tempestades eu te defendi, tu me protegeste, nos salvámos, aqui mesmo.
Passamos por nevões gélidos, onde te aqueci, onde me aqueceste.
Todos esses quadros das paredes desta sala se resumiram a uma imagem baça.

O sol irradia levemente o dia quando ecoa um bater da porta.
A noite foi longa, e a porta fecha.
Tu fechas a porta.
Tudo se torna mais claro e límpido.
A luz incide na tua imagem, nos teus olhos, e fá-los brilhar num caminhar direito a mim
(apesar de continuar a achar que eles têm luz própria)
Essa mesma luz que ilumina toda a sala, e consequentemente a mim.

É tudo tão melhor quando estás por perto…

quarta-feira, 22 de abril de 2009

virtude de impotência

imagem: virtude dos impotentes

Quando quiseres, aparece…
Como grão de areia numa brisa marítima,
Como arco-íris num dia de chuva enganado.

Quando quiseres, aparece…
Como uma estrela que rasga o céu nocturno na sua queda,
Como vento que leva árvores a favor da sua dança.

Quando quiseres, aparece…
Como uma carta atrasada,
Como uma nuvem perdida que escala a montanha.

Quando quiseres, aparece…
Sem que me dê conta do teu aparecer,
Para que sinta, por uma vez, que não faço parte de uma vida esquecida.

Quando quiseres, aparece…
Aparece em toques suaves, não de rompão.
Uma canção pediu-me paciência, por isso

Quando quiseres, aparece.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

paciência...


Os meus olhos apontaram, decididos, para o cume desta mesma montanha, onde o sol se agachava.
Um toque avermelhado um céu limpo, colorindo um suave pôr-do-sol. Um pôr-do-sol tímido. Tímido e diferente.
Tal paisagem me fez lembrar quando, outrora, alguém me tinha escrito sobre o sítio iluminado pelo espectáculo de fim de tarde. Cartas sentidas. Palavras e palavras conjuntas que faziam nexo, sobre uma pequena aldeia, no coração alentejano, onde muitas vidas se cruzam. Talvez essas palavras apenas tivessem sentido para mim.

Nesse fim de tarde, estava eu encostada a uma das Pedras, agora frias, de onde se vê toda a aldeia, e toda uma vida anterior. Foi com a cara iluminada por tons quentes, que eu sussurrei, de maneira a que ouvisses, a resposta a uma dessas cartas: Sim, as pedras separaram-se.

domingo, 22 de março de 2009

carta a ti:

imagem: Paulo Lobo

Hoje, vi a lua nascer. Vermelha, tímida, inocente, medrosa. Guardadora de um fardo, chamado fobia, aconchegado no bolso da sua alma. Fobia de mim, fobia de ti, fobia da sociedade que um dia construímos. A mim, alvo de censura, olha-me de soslaio, num brilhar reprovador. Para ti nem se digna sequer a olhar. Nem para ti, nem para muita gente. Acto que transporta uma vasta tristeza nas suas entrelinhas. Tristeza pela teia de aranha de ideias erradas e entrelaçadas que é a tua cabeça. Umas constroem outras, reproduzem-se, são aos milhares.

Hoje, vi a lua nascer. No seu movimento lento que reflectiu a falta de vontade de voltar a ver-me a mim, e muito menos a ti. Será que ela é tão lenta nos sítios onde não estamos?

Hoje, vi a lua nascer. Ela que mais uma vez me lembrou de que existes, e que também olhas para ela, mesmo longe de mim. Ela, que hoje me disse só nascer para alguns.

Hoje, vi a lua nascer. Enfraqueceu-me a quantidade de amor contido nos seus mares: mesmo sabendo que este mundo não gira à volta dela, ela fá-lo, há imenso tempo, dia após dia. Enfraqueceu-me saber o quão fracos somos. Enfraqueceu-me saber o quão insignificante é a presença do meu ser neste universo. E revoltou-me a estadia insistente de um certo egocentrismo nos confins dos meus sentimentos. Quando nem à volta da lua, sofredora e insistente, o mundo gira.

Hoje, vi a lua nascer. Hoje, apenas na força de uma troca de olhares, ela mandou-me dizer-te tudo isto.
Agora, a lua está no céu. Petrificada, fria, e inundada pelo reflexo dos meus olhos, à espera que tu leias o que ela me mandou dizer.

sexta-feira, 20 de março de 2009

metade.

E foi hoje,
no momento em que um raio me acertou,
que eu descobri que afinal
até havia outra metade de mim.

terça-feira, 10 de março de 2009

a tua porta

Bati à porta.
Queria saber se, uma vez na vida, estavas para mim.
Queria contar-te histórias que me têm embalado nestes frios dias;
Queria abrir a minha cabeça repleta de ideias e deixar que te envolvessem, dançando em ti.

Bati à porta, ouvi ecoar dentro de casa.
Queria abraçar-te, deixar de lado todo o rancor que aqui dentro esteve camuflado;
Queria contar-te as minhas tristes noites sem ti;
Queria tatuar no teu corpo toda a nossa complexa história, e sublinhar, no fim, que esta não tinha acabado;
Queria sentir-te…

Bati à porta, pela terceira vez.
Observei a minha mão imperfeita num acto repetitivo.
As ideias reproduziam-se, multiplicavam-se, o que me incomodava ainda mais.
Tinha tanta coisa para te contar…
Impaciente e ansiosa, dei por mim a bater com o pé no chão,

A porta abriu vagarosamente…
Uma cabeça inclinou-se por de trás dela, lançada num som que me pareceu “quem é?”
E lá estavas e tu.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

"uma mão cheia de nada, e o mundo à cabeceira"




Parede,
Tu que serves de encosto,
Por entre cada antiga pedra tingida por fungos,
Por entre cada fenda coberta e abafada por musgo,
Sussurra-me se faz sentido
Toda esta viciante comodidade
Se “tudo muda, tudo parte, tudo tem o seu avesso”

Sol,
Ilumina toda essa utopia que é a palavra tristeza,
Faz dela brinquedo frágil,
Parte-a.
Destrói-a, como uma inocente criança.

Vento,
Com as brisas doces de recordações bonitas,
Traz-me o arrepio da felicidade.
Faz-me cheirar essas inigualáveis especiarias,
Guardadas no cesto da bicicleta do tempo em tons de sépia.

Mar, escuta
Atenta no ranger das minhas velhas portas,
Abre-as com a força das tuas correntes
E leva nas tuas águas todos esses medos do que foi.
Descobre a porta com melhor perspectiva para este labirinto que é a vida,
Chama por ela, como o fazes a mim,
Quando no teu vai-vem me puxas suavemente as pernas.


(...)

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

eu disse-me ...

Tento eu escrever sobre "coisas felizes", quando as minhas mãos e a minha mente me conduzem para pensamentos e lembranças menos felizes.

Tu nunca estás aqui, muito menos estiveste aqui perto.
Tu nunca estiveste aqui, nem nunca te senti perto de mim.
Punhas-me na tua lista de compras de super-mercado.
Sabes o que é fazer parte de uma lista de super-mercado?
Eu posso esperar. Pois bem, não posso. Não posso e não espero mais.

A cada dia que passa, a cada noite que passa, o frio invade o teu lado da cama.
Há alturas em que invade a cama por completo.
Devido a noites em branco a pensar no porquê de não se abrirem as jaulas intemporâneas que me prendem a alma.
Mudaria a história, se me permitissem tal traição em inventer o tempo. Mudaria?
Desisti de pensar nisto. E que fique bem ciente que só desisto em caso de necessidade extrema.

A divergência causada pelo cruzamento das nossas vidas, não foi em vão.
Se calhar não nos completávamos assim tanto.
O quarto mudou de sitio. Quem o habita agora são fantasmas que se alimentam da tal, e grandiosa, tristeza.
Rindo à gargalhada mais e mais, pela abundância de alimento, cada vez que os meus pensamentos te tocam.
Eu disse-me. Por agora, deixo este lugar.
E talvez nao tencione voltar.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

a soleira da porta.



O vento parou.
O mundo parou com ele.
A porta abriu e assim ficou
Ele saiu, para longe.
Até que o horizonte impedisse a minha vista de lhe tocar.
Eu fiquei, nessa soleira da porta, a tentar impedir que o horizonte me impedisse.
Eu fiquei, de olhos molhados.
Eu fiquei a vê-lo ir.
Isto doeu. Doeu bastante.
Ver malas feitas de tudo o que era Nosso.
Vê-lo pegar nelas e partir.
A porta ficou aberta.
Eu não a fechei.

O vento voltou.
A porta, aberta, tinha-me lá a mim, encostada à sua soleira.
Como todos os dias, de joelhos, num súplico constante para que acabassem com tal dor.
O vento voltou.
O mundo girou na sua dança.
Era ele, no horizonte.
Era ele e os meus olhos brilharam ao obter essa confirmação.
O coração encheu-se de luz, tal como aquela casa, tal como o sol do meio-dia.
Esbocei um sorriso forte e sincero.
Corri, corri até ele, com lágrimas de felicidade a deslizarem face abaixo.
Ele largou as malas e abraçou-me.
Levantou-me até que ficasse do seu tamanho.
Levantou-me até que o meu nariz chegasse ao seu.

- Nunca voltes a ir…
- Eu sempre aqui estive.



imagem: "Despedida" - Peter W.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

questões de sensibilidade.


Horas, horas e horas - num ápice.
Odeio rotinas.
Odeio estar, ou sentir-me, presa num sítio! Parece que começo a sufocar - e é isso que está a acontecer.
Isto cansa-me. Cansa-me mais do que dar a volta, a correr, a quatro quarteirões. Nunca o fiz, mas imagino que canse.
E está a começar a faltar-me o ar, aqui dentro.
Pergunto-me, e deixo a pergunta a quem souber responder: O que são as "pessoas" que se deixam rastejar por todas essas horas, em desespero insensivel?
Preciso de luz, preciso de ar, preciso de uma brisa. Mas sei exactamente onde encontrar.
Quando sinto que os ponteiros de relógio fazem um nó envolto no meu pescoço, sei qual é o melhor abrigo onde me refugiar. Abrigo que apaga essa sensação. Esse abrigo é uma simples caneta.
"Pessoas" dessas, têm algum tipo de abrigo?
Eu não entendo. Serão pessoas sem sensibilidade de alma?

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

imagina!


Um dia destes, deparei-me com esta conversa de um menino de 6 anos:
- Porque é que não posso dizer às pessoas que leio a mente delas?
- Porque é obvio que isso é mentira!
- E se não for? Elas não sabem!
- Se não for, tens de fingir que é, e ser igual a todas as outras pessoas.
- Ser igual às outras pessoas é bom?


Resposta que me ficou entalada na garganta:
Não, não é bom. Porque é que não posso dizer que nasci de uma árvore? Ou ter vindo do espaço... E quem diz eu, diz tu também. Porquê, se temos um mundo nas mãos para sermos o que quisermos?
Sabes o que faz falta neste mundo? Talvez ainda sejas muito novo para entender, ou talvez não, mas o que faz realmente falta são mais malucos. Falo de gente que fale com pombos, com árvores, gente que valorize todo o tipo de vida, afinal "uma vida, uma dadiva!". Gente com a mente aberta ao batalhão de "porquês" existentes. Falo de gente que durma na praia só para ver o sol nascer, gente para além do modulo da humanidade. Falo de gente que tire fotografias a pedras e faça delas uma obra-de-arte, gente que pinte uma simples folha de árvore em pleno Outono e sinta essa pintura como uma das "7 maravilhas". Falo de gente que sinta e veja o mundo para além do lado físico e material. Falo de gente "maluca" que de maluca não tem nada, tem apenas asas para voar no meio de tanta outra gente que torna as suas invisiveis, inexistentes. Talvez um dia seja tarde para as tratar como reais. Talvez até nunca lhes tenham ensinado a tal. Falo de gente que não tem o céu como limite. Falo de gente que tenha a verdadeira noção do que é vida. Falo de gente racional. Exacto, falo de malucos racionais! Falo de gente não comodista. Falo de arte e de paz em estado bruto: falo de gente que use as asas para as sentir. Falo de gente que acredita ter apenas dois dias de vida, e os vive. Será que consegues acompanhar-me?
Falo de gente que se conta pelos dedos... Falo de gente que faria do mundo um lugar interessante para se viver.
Imagina essa gente. Agora imagina o mundo florido de gente como essa. É fácil, se tentares.


"you may say that i'm a dreamer, but i'm not the only one."

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

voa, mentira. voa.

Mentiras que fazem voar
Voa com o vento toda dor que faz mentir
Faz doer aqueles que mentem
Talvez eu voe quando tiver mentiras pra contar

Palavras que magoam ao dizer
Se magoa com o que é dito
Dói a alma daqueles que ouvem
A minha alma chora com o que se diz

Morre aquele que se lembra
Se lembra de todo o medo que sentiu
Medo é tudo o que sinto
De ti, de ti não me vou lembrar

Sorrisos que fazem chorar
Chora com a tristeza aqueles que fazem sorrir
Faz lágrimas cair aqueles que choram
E talvez nunca pare.

Talvez nunca pare...