sexta-feira, 29 de maio de 2009

"impasse"


imagem: "sombra"- autor desonhecido

A escuridão invadiu os meus olhos quando te apressaste em entender tudo o que tinhas feito de forma errada, ao longo do teu percurso. A tristeza não se inibiu em apressar-se, alargando o seu passo rumo ao meu peito. Querias voar, não era? Era isso que tinhas camuflado nas tuas entrelinhas, quando meu sistema de negação se encarregou de não as captar.

Lembrara-me do dia em que me retiraste da onda de pó que cobrira a sala onde fiquei, e consequentemente me cobrira a mim, no acto desesperado de tapar o sofrimento que em meus olhos escorria, chegando a formar rios. Formara-se uma espécie de lama, lama em cada canto (meu, e da dita sala) … e em cada um desses cantos um negro consolidado prendera cada movimento que fosse possível de efectuar…
Foi nessa prisão que, conscientemente, eu deixei de me esforçar, de lutar, de me tentar libertar.

Quando entraste nessa sala, e, sem medos nem quaisquer hesitações, me arrancaste da escura estátua em que se tinha transformado o meu ser - porque talvez tenhas sentido algo mais que pó no canto onde eu me camuflara – a minha vida tomara outro rumo. Um rumo à felicidade.

Pois agora, querias voar, querias partir.
Sinceramente, quem dera que lá me tivesses deixado ficar…

domingo, 24 de maio de 2009

chave

James Hutton disse que "O presente é a chave do passado".
Será o passado a fechadura do presente?


Então mas... Estes termos (de certo modo, caídos numa utopia) não se tornam um pouco contraditórios aos que normalmente ouvimos...?

sexta-feira, 15 de maio de 2009

grita-me!


imagem: "bolhas para exibir o sol"

Grita-me!
Grita-me,
Como nunca o fizeste.
Grita-me, que eu
Gritar-te-ei com as restantes forças

Grita-me, vida!
Grita-me!
Grita-me na entoação
Do teu “porquê”,
Dos teus “porquês”.

Grita-me, vida!
Grita-me do centro da Terra,
Grita-me do ponto mais alto,
Grita-me um sentido,
Grita-me uma direcção!

Acorda-me no embalar
Da tua tristeza, da crueldade,
Mas grita-me, impera-te
Ensina-me como e
Com o quê gozar de ti.

Grita-me…
Grita e faz-me sentir,
Acorda-me desta anestesia
Que és tu, vida.
Quem, queria eu perguntar.

Grita e volta a gritar-me,
Faz-me ascender do fundo do mar,
Num tilintar de bolhas
Calmo, tal como alforrecas,
Do mar onde me deixaste adormecer.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

nevoeiro


A porta abre suavemente, com um ligeiro sopro.
Eu não te vou dizer que tenho medo,
Implorar que não vás,
Ou dizer-te que não vivo sem ti.
Talvez não viva.
Mas isso fazem os fracos.

A porta recua, esboçando a tua certeza.
A sala branca fica nublada sempre que deixas entrar essas incertezas.
A cor dela não muda,
Muda sim a nitidez da imagem através dessa mesma cor.
É baça. É fria, é húmida.
E eu não me sinto confortável.

A luz que atravessa o vidro da janela não é suficiente para iluminar a suspensão.
Talvez um dia entendas…

A porta fecha. A porta abre.
A maré vem, a maré vai.
Chega lua cheia, chega lua nova.
A porta fecha.
A porta abre.
Onde estás tu agora?

Outrora, sei que esta sala teve outras paisagens.
Em areais caminhámos, aqui mesmo. Ambos seguindo o som do mar reflectido nos seus búzios imortais.
Em tempestades eu te defendi, tu me protegeste, nos salvámos, aqui mesmo.
Passamos por nevões gélidos, onde te aqueci, onde me aqueceste.
Todos esses quadros das paredes desta sala se resumiram a uma imagem baça.

O sol irradia levemente o dia quando ecoa um bater da porta.
A noite foi longa, e a porta fecha.
Tu fechas a porta.
Tudo se torna mais claro e límpido.
A luz incide na tua imagem, nos teus olhos, e fá-los brilhar num caminhar direito a mim
(apesar de continuar a achar que eles têm luz própria)
Essa mesma luz que ilumina toda a sala, e consequentemente a mim.

É tudo tão melhor quando estás por perto…